domingo, 25 de dezembro de 2011

O FIM DE NÓS MESMOS


Por

Gonzalo Sepúlveda

"Miserável de mim! quem me livrará deste corpo de morte?"

(Romanos 7:24).

Bem conhecida exclamação de Paulo em Romanos 7:24, costuma desconcertar muitos cristãos. Muitos chegam a duvidar de que esta expressão represente a um renascido; ao contrário, parece à condição de um mundano sem relação alguma com o Salvador Jesus Cristo. No entanto, devemos reconhecer que, na sabedoria divina, este famoso capítulo 7 do livro de Romanos está muito bem localizado no Novo Testamento.

A revelação de nós mesmos

Até a metade do capítulo 5 de Romanos, Paulo expõe amplamente a respeito da obra do nosso Senhor Jesus Cristo na cruz em seu aspecto externo ao homem em si: o perdão dos pecados cometidos, por meio do sangue derramado (3:25), o repouso da consciência ou a bem-aventurança de quem sabe que está perdoado (4:7) e em paz para com Deus (5:1).

Mas, a partir da segunda parte do capítulo 5 desta importante epístola, o Espírito Santo começa a nos revelar a condição de "nós mesmos"; não somente os delitos e pecados que nos afastavam do Deus santo, e sim a "constituição" do próprio homem por causa da herança adâmica (5:19).

Nenhum dos frutos do verdadeiro cristianismo poderá ser vistos na vida e testemunho prático do crente, a menos que consiga compreender esta vital revelação que as Escrituras nos mostram a respeito de nós mesmos. A tão sonhada restauração da igreja, a vida corporativa, o funcionamento de todos os membros, a unidade dos filhos de Deus renascidos em Cristo, o testemunho do evangelho por meio da igreja às nações, etc., não será possível, nada será uma prazerosa realidade, a menos que todos, ou a maioria, ou ao menos muitos irmãos e irmãs em Cristo, cheguem a uma clara e inteligente experiência de Romanos capítulos 6 e 7.

Uma das maiores desgraças do cristianismo contemporâneo consiste em que a grande maioria dos irmãos não passa de Romanos 4 em sua experiência de fé, o qual os torna tremendamente vulneráveis na hora de enfrentar situações de provações, tribulações, perseguições, desilusões, conflitos entre irmãos, (leia-se divisões), e batalhas espirituais com o inimigo, Satanás, o acusador.

Quando lemos Romanos capítulos 12 a 16, nos encontramos com uma igreja sonhada: com todos os membros amando-se, preferindo-se e abençoando uns aos outros (12), com um fiel testemunho diante do próximo, diante das autoridades civis, desprezando as obras das trevas e revestindo do Senhor Jesus Cristo (13), recebendo uns aos outros, sem lutas, menosprezos nem julgamentos, vivendo para o Senhor (14), suportando, recebendo e abundando em esperança pelo poder do Espírito Santo, cheios de todo conhecimento (15), e todos os santos servindo com gozo ao Senhor, abrindo as suas casas para a comunhão da igreja e para a evangelização, atentos contra toda divisão e tropeços contra a doutrina (Cristo), servindo sempre a "nosso Senhor Jesus Cristo" e esmagando a Satanás debaixo dos seus pés (16).

Bendita igreja de Cristo, bendita noiva que espera o seu amado, bendito testemunho para quem jaz em seus pecados, bendita luz a um mundo egoísta e escravo de paixões infames. Essa é a igreja sonhada por todo servo fiel e - por que não dizê-lo -, pelo próprio Cristo. É a igreja gloriosa, é a glória posterior (maior que a primeira), pela qual o Senhor virá, fechando a história da graça e iniciando a nova era do seu bendito reinado (como é anunciado em Apocalipse 12:10; 19:7 e 20:6).

Mas, amados irmãos, nada disto poderá se realizar, se não passarmos pelo "máquina de moer" de Romanos 6 e 7. Temos que chegar ao fim de "nós mesmos", a ter-nos por homens e mulheres miseráveis, incapazes de realizar os propósitos divinos; nossas forças devem ser enfraquecidas ao extremo, para dar lugar à vida sempre poderosa e triunfante do Espírito Santo. Quando um cristão não passou por este tipo de crise, costuma tornar-se perigoso - mais ainda, de pouco confiança - na obra de Deus.

Quando Pedro sugeriu ao Senhor que não fosse a Jerusalém, sem dar-se conta, estava recorrendo às suas próprias idéias, ou seja, à sua força natural, às suas "boas intenções". Como sabemos, o Senhor Jesus atribuiu ao próprio Satanás tais intenções (Mateus 16: 22-23). (Neste episódio Pedro representa a muitos cristãos inexperientes, meio formados, cheio de boas opiniões, mas longe de agradar ao seu Senhor). Foi só depois do triste episódio da negação, que este servo chegou a conhecer a si mesmo. Tal experiência é o melhor exemplo do relatado pelo apóstolo Paulo em Romanos 7:24. Naquele pranto amargo (Mateus 26:75), Pedro tomou real conscientização da sua miséria pessoal.

Em Lucas 5:8, Pedro tem consciência dos pecados cometidos em sua vida antes de conhecer o senhor Jesus, mas em Mateus 26 chega a ter consciência de sua incapacidade natural de agradar ao Senhor com as suas próprias forças: teve o "querer fazer o bem, mas não a capacidade de realizá-lo" (Romanos 7:18). Isto é o que tecnicamente poderíamos definir como "a operação ou experiência subjetiva da cruz". No Antigo Testamento este tema está amplamente tipificado em todos os fracassos de Israel em sua peregrinação pelo deserto e também na circuncisão de todos os homens na colina de Haaralote, relatado no livro de Josué capítulo 5, entre outras passagens.

A necessidade de uma experiência mais profunda

Amados irmãos e irmãs que de coração limpo invocam o precioso nome de nosso Jesus Cristo em todo lugar, vivemos uma hora crucial no desenvolvimento do propósito de Deus nesta geração. É urgente e necessário que inclinemos o coração diante do trono do nosso bendito Deus e Pai e reconheçamos que, a menos que a vida da ressurreição do nosso Senhor Jesus Cristo se manifeste em cada um de nós, não seremos de muita utilidade no seu reino. Para isto, é necessário que a Sua palavra faça-se vida em nós, que deixemos atrás os tempos de preguiça e negligência, os tempos em que só líamos passagens devocionais favoritos em nossas Bíblias, e roguemos ao Senhor que nos revele a sua palavra da cruz (1ª Cor.1:18) tal como ele deseja que a conheçamos; que passemos para uma etapa mais elevada, mais madura, de nossa experiência em Cristo Jesus.

Até quando o nosso testemunho estará limitado à experiência do perdão dos nossos pecados por Seu sangue? Já não é tempo de levantarmos e proclamar que em Cristo morremos para o pecado e que, além disso, morremos para a lei? Não descansemos (na realidade não há descanso possível), até que o que está escrito em Romanos 6, 7 e 8 venha a ser parte da nossa própria vida, de nossa bendita experiência em Cristo. De outra maneira, passaremos a fazer parte da extensa lista de cristãos frustrados, que jamais entraram nas riquezas da graça do nosso Deus e que estão expostos a ter grande perda no tribunal de Cristo.

Deus nos chama a sermos protagonistas do nosso tempo, vencedores em meio de um cristianismo morno e conformista. É hora de nos levantar com o poder da "lei do Espírito de vida em Cristo Jesus", para que o Senhor Jesus Cristo obtenha a Sua igreja gloriosa. Ele a obterá sem dúvida, mas nossa aspiração deve ser estar lá: ser parte da noiva vestida de linho fino, ser um dos vencedores de Apocalipse 2, ser dos servos fiéis de Mateus 25.

É fácil reconhecer a vida de Cristo fluindo em outro irmão. Torna-se bela e singela a relação de comunhão, de amor e até de serviço entre os servos, irmãos e irmãs, cujo único centro das suas vidas é o próprio Cristo. De outra forma, se tão somente nos encontrarmos com um 'sábio cristão', de conhecimentos fora do nosso alcance, com uma vida cristã teórica e religiosa, ao relacionarmos com tal irmão, nos encontraremos talvez com boas doutrinas, com uma linda história, mas, enfim, só tocaremos 'no homem' que sustenta certas verdades (pelas quais lutará até render a sua vida), mas infelizmente, ao não encontrarmos com a inconfundível vida de Cristo nele, a comunhão é algo quase impossível… A cruz não foi provada na experiência; a arrogância e a auto-suficiência do homem natural ainda estão muito presentes.

Certamente para muitos dos nossos leitores este tema já lhes é conhecido e repetitivo nesta publicação, mas de algum forma sentimos que não devemos deixar de insistir sobre o mesmo, pois a ignorância de muitos filhos de Deus os mantém cativos, sem saída nem resposta diante das grandes interrogações do estancamento da fé. É triste ver multidões de cristãos, em muitos lugares, seguindo lideranças e/ou doutrinas heréticas. Muitas vezes, as ovelhas do Senhor terminam exauridas por quem - como profetizou Paulo em Atos 20:29 - não poupando o rebanho, fazem dos santos uma mercadoria, enquanto estes jazem em sua ignorância, ofuscados pelas coisas externas da fé.

Muitos terminarão frustrados, desiludidos, pois nunca amadurecerão; viveram pela fé de outros, até terminarem enredados em sua própria ruína.

Digamos, finalmente, que Deus quer que, além de reconhecermos que somos pecadores por causa das faltas cometidas, cheguemos ao fim de nós mesmos, a reconhecer que, a menos que Cristo viva em nós (isto implica nossa crucificação nele), não poderemos jamais agradar-lhe. Então nos firmaremos no Espírito Santo, poderoso para nos vivificar interiormente e, em comunhão com todos os que se negaram a si mesmos, veremos os dias mais gloriosos da história da igreja… a igreja gloriosa pela qual nosso Marido celestial não tardará em retornar!

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